terça-feira, 13 de maio de 2014

De Noche y de Pronto (2012)

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De Noche y de Pronto de Arantxa Echevarría é uma curta-metragem espanhola de ficção já nomeada ao Goya da Academia Espanhola de Cinema na sua categoria e que marcou presença na secção Fantástico da quinta edição do Piélagos en Corto - Festival Internacional de Cortometrajes de Ficción que decorreu de 5 a 10 de Maio na Cantábria, em Espanha e onde marquei presença enquanto um dos júris do certame.
María (Alicia Rubio) encontra-se sozinha em casa a tentar disfrutar de uma noite tranquila na época natalícia quando subitamente bate à porta um homem (Javier Godino) que se apresenta como um seu novo vizinho. Este homem, aparentemente enervado, revela-lhe que alguém se encontra dentro da sua casa e que não tendo telemóvel consigo precisa entrar para assim poder chamar a polícia.
Confundida e receosa María deixa-o entrar. No entanto, é quando toca um telemóvel que não o seu que ela se encontra perante uma experiência de sobrevivência enervante mas, ainda assim, onde as emoções mais selvagens parecem atrapalhar o seu raciocínio.
De Noche y de Pronto prima pelo argumento de Echevarría que nos brinda nos seus cerca de vinte minutos, com o melhor que existe no suspense e thriller psicológico obrigando o espectador a enfrentar não só aquilo que pensa ter como garantido como principalmente com os seus próprios medos e receios inerentes a uma sociedade moderna onde reina a desconfiança.
Todos os ingredientes estão presentes... a solidão nos meios urbanos onde cada um de nós (sobre)vive num meio rodeado de pessoas sem que, na realidade, alguma delas esteja realmente próxima (na realidade... conhecemos nós todas as pessoas que vivem no mesmo espaço em que nos encontramos?), a perpetuação desta mesma solidão quando num edifício supostamente com dezenas de habitantes poucos ou nenhuns por lá se encontram ou tão simplesmente que nível de confiança estamos dispostos a entregar a alguém que, não conhecendo, diz estar em apuros?! Echevarría brinca com todas estas premissas típicas do género e leva o espectador numa viagem de suspeitas, desconfianças, histórias por contar através dos medos mais básicos que qualquer um de nós pode, à partida, aparentar ter.
As filmagens e os planos que capta são disso dignos e em todos os momentos sentidos que o clima, apesar de festivo, é tenso. Os olhares e as pequenas conversas onde tanto fica por dizer consomem o nosso lado mais selvagem e revelam que o querem despertar e se por um lado queremos ajudar aquele homem que diz estar numa situação complicada, não é menos verdade que o nosso íntimo revela, tal como a "María", que algo não parece estar a bater certo e que ele tem mais por contar do que aquilo que aparenta. No fundo... tudo uma questão de aparências. Será o seu drama assim tão real? Estará a casal daquele homem realmente a ser assaltada? Será o lado mais frágil de "María" assim tão real? Será ela realmente uma vítima numa situação que não consegue controlar?
É no meio destes dilemas que o espectador vive durante perto de vinte minutos. As incertezas, os medos mais básicos e o instinto de sobrevivência levam-nos, muito rapidamente, a assumir que estamos perante uma situação na qual não devemos confiar em ninguém. Aquilo do qual nos esquecemos é que esta premissa deve valer também para nós próprios fazendo com que os nossos próprios medos não ganhem proporções que parecendo ser válidas... na realidade não o são!
Com duas interpretações tão intensas, De Noche y de Pronto é um filme que nos agarra desde o primeiro instante. A dar alma à indefesa "María" temos uma predominante Alicia Rubio que nos seduz com o seu ar frágil e quem está prestes a sofrer a provação da sua vida. O seu ar angelical e doce conduz qualquer um de nós a torcer para que aquela situação tão caricata não se revele ser prejudicial para ela. Elementos estes que, a médio prazo se revertem conta o próprio espectador revelando assim que Rubio tem muito mais do que a alma para entregar à sua personagem e é, também ela, um conjunto de elementos surpresa e força física que mostram que não precisa de nenhum guarda-costas para sobreviver quando a situação a isso a obriga.
Por sua vez, Javier Godino que todos nós conhecemos do seu arrebatador desempenho no filme premiado com o Oscar de Filme Estrangeiro El Secreto de sus Ojos, revela que não só é um dos actores espanhóis do momento (sim, por favor chamem-no para mais filmes), como também demontra que por detrás daquele rosto supostamente angelical está algo demoníaco prestes a aparecer... ou talvez seja isso mesmo que nós queremos ver quando, na realidade, poderá ele mesmo ser a vítima!
Rubio e Godino fazem o "anti-par" perfeito. Cada um deles induz o espectador a antever, esperar e de certa forma desejar ver algo que talvez não seja aquilo que cada uma das suas personagens é na realidade sendo esse o principal elemento que torna De Noche y de Pronto numa curta-metragem eficaz, desesperante e um dos melhores e mais recentes filmes sobre a clausura no espaço que nos é mais familiar... o lar.
Finalmente uma nota também positiva à direcção de fotografia de Pilar Sánchez Díaz que de início nos conquista pela apresentação de um espaço onde as luzes e as cores convidativas de uma época natalícia nos fazem querer estar naquele local mas que, com o passar dos minutos, o transforma num local de terror e onde o espaço parece ficar cada vez mais pequeno e intimidante levando-nos a locais mais claustrofóbicos que a nossa própria mente começa a criar.
De Noche y de Pronto confirma aquilo que o bom terror pode ser ao encontrar os medos de uma sociedade dita moderna e urbana não pela potencialidade daquilo que o "outro" pode fazer mas sim pela certeza daquilo que o "eu" pode criar quando recorre aos seus mais escondidos (e selvagens) pensamentos.
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8 / 10
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