quarta-feira, 30 de abril de 2014

Kuzui Kinshiro

.
1925 - 2014
.

37°4 S (2013)

.
37º4 S de Adriano Valerio é uma curta-metragem francesa de ficção presente na secção IndieJúnior da edição deste ano do IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente.
Tristão da Cunha é uma ilha perdida no meio do Oceano Atlântico. Com uma população de apenas 270 habitantes, Nick (Riaan Repetto) e Anne (Natalie Swain) são dois jovens adolescentes apaixonados que não só se conhecem desde que nasceram como em breve irão ver o seu amor colocado à prova graças à deslocação de Anne para Inglaterra... a milhares de kilometros de distância.
Valerio, também autor do argumento desta curta-metragem, tece aqui um sentido e muito honesto retrato não só sobre o amor como sobre o isolamento. A sensação de se sentir que a pessoa que se (nos) completa e que pode desaparecer para o outro lado do mundo e com isso fazer perder todo o sentido da vida, ou pelo menos aquele que em tão jovem idade se sente, são assim captados de uma forma sensível e honesta que nos faz apaixonar por esta terna história de um amor intocado, honesto e extremamente sentimental na sua forma mais pura.
Ao contrário daquilo que o título desta curta-metragem indica, nem o amor nem o seu lugar no mundo precisam de coordenadas - geográficas ou sentimentais - mas sim ser sentido, vivido e tido como algo que se sabe ser certo, honesto e verdadeiro. É isso que algures perdido no meio de um vasto Oceano se transmite ao espectador. Ainda que o espaço seja pequeno e com um limitado conjunto de pessoas, este foi o suficiente para se saber que estão ali duas pessoas que se completam independentemente da sua jovem idade, e que percebem que mesmo com a distância e os demais relacionamentos que um deles pode vir a experimentar, os dois estão feitos um para o outro.
Para além de um amor sincero, o primeiro e o de juventude, Valerio consegue ainda captar a essência de uma vida sentida em solidão que, quase como oposição ao amor vivido a dois coloca as experiências do jovem "Nick" em evidência perante o mundo. Precisará ele de algo mais para se sentir completo para além das coisas e dos espaços que sempre conheceu? Ele sabe que aquela estrada, a única que atravessa a ilha, sempre ali esteve - tal como ele - e que é a suficiente para fazer todo o percurso de um lado ao outro da ilha. Colocam-se então as questões... precisará ele de algo mais? De outras certezas? De outros caminhos? Quem poderá afirmar que ele não se encontra no seu estado e local ideal?
Vencedor de uma Menção Especial no Festival Internacional de Cinema de Cannes, 37º4 S é uma sentida e honesta curta-metragem sobre o lugar do Homem, ainda que ele seja apenas um adolescente, no mundo e na simplicidade de uma vida que o completa, que o deixa feliz ainda que desprovida de todos aqueles bens e espaços que podem para qualquer um de nós ser considerados como "essenciais". Curta-metragem esta que é enriquecida por uma sentida interpretação de Riaan Repetto, uma música original de Romain Trouillet capaz de nos fazer transportar para um qualquer lugar perdido no mundo e uma direcção de fotografia da autoria de Adriano Valerio e Loran Bonnardot que graças à captação de um conjunto de sombrias luzes nos insere num espaço pelo qual o tempo não passou.
Se não outra coisa, arriscaria dizer que 37º4 S mais não é do que um poema visual... uma ode à vida que apenas poderia ser encontrada num espaço por onde aparentemente o tempo insiste em não se fazer sentir.
.
.
9 / 10
.

Sophia Loren convidada para Cannes

.
O Festival Internacional de Cinema de Cannes anunciou como uma das suas convidadas especiais a actriz Sophia Loren.
Loren que vencera o Prémio de Interpretação Feminina em Cannes assim como um Oscar pelo seu desempenho no filme La Ciociara, de Vittorio De Sica, foi ainda presidente do júri no respectivo festival em 1966, e estará agora presente na secção Cannes Classics como também acompanhará a projecção do filme La Voce Umana, do seu filho Edoardo Ponti e estará ainda presente na exibição de Matrimonio all'Italiana, de De Sica.
Finalmente Sophia Loren irá ainda efectuar uma masterclass a realizar no palco da sala Buñuel.
.


.

IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente 2014: destaques para o sétimo dia

.
Hoje e amanhã juntam-se a nós em Lisboa os realizadores Claire Simon (Herói Independente), Jean-François Caissy (La Marche à Suivre), Thierry de Peretti (Les Apaches), Akiro Hellgardt (Hinoki Farm), Mehran Tamadon (Iranien), Yaël André (Quand je Serai Dictateur) e Tomasz Sliwinski (Our Curse), entre outros convidados.
Às 16h45, na Sala 3 do Cinema City do Campo Pequeno, é possível assistir ao belíssimo Deux Fois le Même Fleuve, realizado por Amir Borenstein e Effi Weiss, um documentário que surgiu da viagem destes dois artistas visuais que recriaram o percurso de John McGregor ao longo do Rio Jordão numa época em que a região está invadida por turistas, ganhando contornos muito diferentes dos que se esperava de uma região com tão forte conotação espiritual. Os realizadores estarão presentes na sessão para conversar com o público.
Destaque também para Ça Brûle, de Claire Simon, Herói Independente desta edição. Ça Brûle é um retrato de Lívia, uma miúda de 15 anos, mas também do lado egocêntrico, destrutivo e obstinado da adolescência. Em exibição na Sala 3 do Cinema São Jorge, às 18h45, em passagem única no IndieLisboa.
O Novo Testamento de Jesus Cristo Segundo João, de Joaquim Pinto e Nuno Leonel, integra a Competição Nacional de longas metragens. Os realizadores afirmam: “não somos teólogos nem pertencemos a qualquer igreja, mas estamos irremediavelmente impregnados por 20 séculos de cultura cristã” e pretendem que esta cultura cristã, a palavra, seja passada. Para ver este filme basta estar às 21h30 no Grande Auditório da Culturgest.
A portuguesa Inês Gil realizou o documentário Sangue na Guelra, um olhar sobre o Projecto 12/15 da Escola Intercultural da Amadora, que será mostrado às 21h45 na Sala 3 do Cinema City do Campo Pequeno. São-nos apresentados os jovens deste projecto e assistimos ao seu regresso à escola, um local com o qual se devem identificar e onde se devem sentir mais integrados.
The Punk Singer, um dos grandes filmes da secção IndieMusic, é o documentário de Sini Anderson sobre a vida de Kathleen Hanna, vocalista das Bikini Kill, Le Tigre e Julie Ruin. A atribulada vida da activista e figura central do movimento Riot Grrrl é o foco do filme, uma sessão que tem início às 23h45 na Sala 3 do Cinema São Jorge.
A música não acaba na sessão IndieMusic. Logo a seguir ao filme, o Primeiro Andar (a partir das 23h) e o Metropolis Club (a partir da meia-noite) estarão a postos para receber todos os que se quiserem divertir pela noite dentro, junatmente com a equipa e convidados do festival.
.

terça-feira, 29 de abril de 2014

Bob Hoskins

.
1942 - 2014
.

Ponto Morto (2014)

.
Ponto Morto de André Godinho é uma curta-metragem portuguesa de ficção presente na secção de Cinema Emergente - Curtas-Metragens do IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente e até ao momento um dos mais interessantes filmes curtos presente nesta edição.
Rita (Rita Só) e Manel (João Nogueira) preparam-se para uma viagem. Após sucessivas paragens pelo caminho e de comportamentos de desejo e sedução encontram-se numa estrada perdida... testemunham um acidente e vêem uma morta.
Até que ponto estarão comprometidos pelas suas próprias decisões? Até que ponto eles próprios existem?
A curta-metragem de André Godinho surpreende de imediato pelo clima entre as duas personagens que julgamos serem centrais. A sua cumplicidade e sedução são de tal forma intensos e a sua viagem parece ser de tal foma cúmplice e de fim de ciclo, que imediatamente nos recordamos daquele feita por "Mickey" e "Mallory" no saudoso Natural Born Killers de Oliver Stone.
É, no entanto, no decurso desta mesma viagem que este par nos revela uma enorme surpresa que abre assim caminho para o segundo segmento da mesma onde à beira estrada permanece o corpo de Soraia Chaves, interpretando-se a si própria, esquecida num acidente do qual aparentemente ninguém quer saber. Todos os que lá se encontram querem ir para outro local sendo que num ciclo sem fim se encontram sempre no mesmo local.
É este segundo segmento aquele que possivelmente entrega a mensagem mais filosófica de Ponto Morto e aquele igualmente define o estado do cinema - português -, o qual é dito a certa altura "está morto". Morto não estará e a originalidade e vanguarda que esta curta-metragem nos apresenta é disso prova. Bem pelo contrário, aqui assistimos à forma como as premissas que conhecemos podem ser desafiadas, como as ideias pré-concebidas que temos das personagens podem ser distorcidas a bem da continuidade de uma história que pensamos já conhecer e como os próprios actores (ou não) conseguem desvincular-se de uma certa imagem que têm vindo a criar entregando-se a novos desafios que são assumidamente vitórias pelo seu risco e concepção. Soraia Chaves é disto exemplo perfeito e a sua interpretação enquanto ela própria que ressuscita de um acidente que se perde entre a ficção e a realidade e que serve fundamentalmente para a própria se afastar de uma certa imagem que o seu início de carreira determinou, percorre as estradas e caminhos sem fim como se num purgatório se encontrasse numa incessante busca de uma redenção que não irá chegar.
É neste percurso, acompanhada de um sempre fiel José Smith Vargas como o assistente de produção que se vê a braços com uma morte com a qual não contava, que Chaves se desmistifica transformando-se simplesmente numa mulher. Mulher essa que não fosse a sua identificação inicial poderia ser anónima numa simbologia de tantas outras que percorrem caminhos nos quais jamais pensariam estar, percorrendo a eternidade sem destino, sem metas e sem finais. Sempre numa eterna espera... A espera para que se "desligue o cérebro", aquele que finalmente condiciona o próprio "ser" mas que se recusa a acontecer condenando assim aquelas duas almas a uma constante e eterna condição, nunca existência, onde o nada é a única certeza.
Filosófico dirão alguns mas por aqui prefiro utilizar a palavra arrojado. Primeiro porque não só nos dá a concepção de filme dentro do filme como depois se recusa a sê-lo e transporta o espectador para uma viagem quase mística, quase de filme apocalíptico onde os mortos estão condenados a andar pelas estradas desertas para toda a eternidade mas que no final se revela uma história sobre a verdadeira morte, aquela que colhe os sentidos, a compreensão e finalmente afirma que o único desejo é simplesmente deixar de "ser".
No final questionamo-nos... perceberemos nós quando estamos realmente mortos? E o que acontece quando essa percepção tarda ou nunca chega?! Ao realizador André Godinho só posso desejar que essa morte criativa nunca chegue... ou pelo menos que ninguém dela se aperceba!
.

.
9 / 10
.
.

Norma Pons

.
1943 - 2014
.

Daddies (2014)

.
Daddies de António da Silva é uma curta-metragem documental presente no IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente que decorre na capital até ao próximo dia 04 de Maio na secção de Cinema Emergente.
António da Silva filma para este documentário em Super 8, um conjunto de homens de San Francisco, na California, cuja idade é superior a 40 anos e que se inserem na identidade "Daddy" - homens homossexuais mais velhos com interesse sexual/sentimental por mais novos - nos seus desabafos em voz-off sobre a sua identidade sexual e sexualidade, a vida e as relações que mantêm ao longo dos tempos.
Daddies exibe um estilo verdadeiramente documental através do relato das suas experiências e vivências destes homens e, lentamente, ultrapassa-as centrando a atenção do espectador no seu corpo e físico. Por sua vez estes homens utilizam-no - ao físico - de forma sedutora, sensual e erótica como forma de relatar essas mesmas experiências transformando o espectador na "cobaia" daquilo que pretendem espelhar sobre a referida identidade "Daddy".
A fotografia, como directo resultado da filmagem em Super 8, oscila entre a cor e o p&b, normalmente granulado, dando a impressão de filmagens "de arquivo", como se de um documento de um passado distante se tratasse facilitando assim que a mensagem seja transmitida de uma forma mais pessoal - e de certa forma íntima - entre os "entrevistados" e o espectador.
.
.
7 / 10
.

Mouton (2013)

.
Mouton de Gilles Deroo e Marianne Pistone é uma das longas-metragens presentes na Competição Internacional do IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente a decorrer até ao próximo dia 4 de Maio.
Esta longa-metragem, cujo argumento é também da autoria da dupla de realizadores, leva o espectador a entrar de imediato na convivência de Aurélien (Michael Mormentyn), vulgarmente apelidado de Mouton por aqueles que o rodeiam.
Inicialmente, e quase num registo documental de memória, percebemos que a justiça e os serviços sociais retiraram Mouton dos encargos de uma mãe incapaz de o manter e que apenas o quer porque "é seu". Com a lei e a própria vontade de Mouton de abraçar uma nova vida longe desta mulher de quem nada sabemos, o jovem começa uma nova vida e com um núcleo diferente que o levam a aprendiz de cozinheiro num restaurante de uma pequena cidade costeira da Normandia, onde executa com perfeição a tarefa que lhe é confiada. Até ao dia em que uma tragédia lhe irá alterar radicalmente toda a sua vida que parecia estar agora finalmente a começar.
A dupla Deroo e Pistone cria um ambiente que transforma o espectador num curioso nato. Apesar de breves instantes a dinâmica inexistente entre mãe e filho desperta em si uma curiosadade quase mórbida. Percebemos que aquela mulher é rude e proveniente de um meio onde os afectos eram apenas mais uma palavra e a cumplicidade maternal que se esperava é algo que nunca existiu. No entanto, e apesar de não voltarmos a este espaço, a viagem que nos leva a acompanhar "Mouton" torna-se ela igualmente viciante. "O que irá acontecer a este jovem?", pensamos a certa altura, e ainda que esta resposta tarde o interesse não se perde querendo sempre saber mais dos estranhos hábitos e comportamentos que não só ele como o grupo que o envolve adquirem. "Mouton" convive, trabalha e apaixona-se, sempre muito reservadamente, como se o seu mundo se limita-se a apenas uma tarefa de cada vez e que momentaneamente tem de executar. A sua expressividade, ou até aquela daqueles com quem convive, é inexistente. Mecanicamente trabalham e divertem-se sem que exista uma real cumplicidade na sua interactividade e assim o espectador passa mais de metade do filme por um lado curioso sobre um conjunto de acontecimentos que parecem querer suceder e, ao mesmo tempo, numa dinâmica de onde irá parar o destino daquele jovem.
De repente, se passamos todo este tempo a "conviver" com "Mouton", não é menos verdade que do nada sabemos de um seu acontecimento trágico, explicado mas não presenciado, que o obriga a afastar-se daquele meio e daquelas pessoas que aos poucos se tornavam a sua própria nova família. É então que a acção se desloca para todos eles, e o espectador é agora levado numa múltipla viagem onde conhece todos aqueles comportamentos mais ou menos desviantes abandonando os destinos de "Mouton". Se inicialmente é a mãe deste jovem que se vê privada da sua presença (contra sua vontade), é agora o espectador que se vê privado da mesma pelos realizadores que decidem que é a nossa vez de seguir caminho para outras paragens, com outras pessoas com as quais temos agora, por imposição, de conviver.
Sem escolha possível há uma mensagem que permanece no ar, ou seja, aquela do abandono. O abandono de "Mouton" por parte da sua mãe e, por sua vez, dele para com uma vida que nunca chegamos a conhecer, o seu posterior afastamento como resultado de um trágico acontecimento e toda uma segunda metade deste filme onde o espectador convive com todo um conjunto de personagens que perpetuam este sentimento... Os gémeos que não reúnem grande empatia com ninguém e a única forma de sentirem algum tipo de ligação é com a ocasional prostituta com quem marcam encontro, o jovem casal que pouco tempo passa em conjunto, o ocasional cão que é abandonado à sua sorte e o próprio "Mouton", outrora grande amigo e membro deste grupo mas do qual ninguém sabe por um tempo indefinido reafirmando que estando longe da vista está, também ele, longe do coração de qualquer um.
Mouton não é um filme fácil e é capaz de cansar o espectador mais desprevenido se já fôr com noções pré-concebidas daquilo que julga ser um filme que deve entreter... Aqui, pelo contrário, não existe qualquer entretenimento mas sim uma vontade explícita de incomodar e de deixar o seu público insatisfeito com aquilo que não chega a presenciar e com o resultado da vida daquele jovem pelo qual nutriu a sua curiosidade inicial e de quem, no fundo, ficam tantas perguntas por responder.
Tecnicamente desafiante pela forma quase documental de filmar aquela(s) vida(s), Mouton prima por uma direcção de fotografia de Éric Alirol perturbadora e que a certo ponto nos faz questionar se não estamos presente um sonho ou uma memória que não percebemos saber de onde chegou, bem como por uma entusiasmante, sólidas mas muito contida interpretação de Michael Mormentyn que poderá muito facilmente figurar entre as seleccionadas no próximo ano para o César de Revelação Masculina... tenha este filme o devido destaque em França.
.
.
6 / 10
.
.

IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente 2014: destaques para o sexto dia

.
Na terça-feira, dia 29 de Abril, começamos por dar destaque à primeira sessão de curtas Pulsar do Mundo, em exibição às 16h15, na Sala 3 do Cinema São Jorge, que integra os seguintes filmes La Reina, de Manuel Abramovich, mostra-nos uma criança que é preparada para um concurso de beleza pelas mãos da sua mãe, Vannacht Worden we Vrouwen foca duas adolescentes e a evolução da sua amizade, num documentário de Josefien Hendriks, Rio 2016, de Bianca Rotaru, revela a competição entre duas ginastas romenas que pretendem fazer parte da equipa nacional dos jogos olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, Bim Bam Boom, Las Luchas Morenas, de Marie Losier, conta a história de três irmãs, lutadoras de wrestling, 2011 12 30, de Leontine Arvidsson, é um documentário que nos apresenta uma mulher, o contorno do seu corpo por si desenhado na parede, e só no fim percebemos o que ela quer dizer.
Em Dial M for Murder, realizado por Alfred Hitchcock em 1954, Tony Wendice engendra um plano nada infalível para matar a sua mulher. Às 16h30 na Sala 1 do Cinema City Campo Pequeno mostramos a primeira tentativa de adesão à tecnologia 3D por Hollywood - a lendária versão do filme que finalmente podemos ver no formato original. A secção Director's Cut a recuperar um clássico de sempre.
Na secção Observatório, destaque para duas curtas que são exibidas às 19h na Sala Manoel de Oliveira do Cinema São Jorge. Thing, na qual um arquitecto fala da cidade que construiu na sua mente - uma animação de Anouk De Clercq - e Pierrot Lunaire, do aclamado realizador Bruce LaBruce, uma história de desejo, amor e transgressão.
Às 19h, na Cinemateca Portuguesa, são apresentados Walk in the Flesh - a curta metragem do português Filipe Afonso criada a partir de imagens originais de Scanners, de David Cronenberg - e A Masque of Madness (Notes On Film 06-B, Monologue 02), uma longa metragem de Norbert Pfaffenbichler centrada na carreira de Boris Karloff e composta a partir de planos do trabalho do actor em televisão e cinema. Os dois filmes integram a secção Director's Cut.
Vitaly Mansky realizou Truba, um documentário sobre um acordo entre a União Soviética e a Alemanha, assinado há 30 anos, onde se estabelecia a construção de um gasoduto a ligar as Europas de Leste e Ocidental. Durante 104 dias a equipa de filmagens percorreu este gasoduto e registou os contrastes ao longo do percurso, as formas de pensar e a vida dos vários habitantes que será exibido pelas 21h45, na Sala 3 do Cinema City Campo Pequeno, aquele que é um documentário da secção Pulsar do Mundo.
.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Centro Histórico (2012)

.
Centro Histórico de Pedro Costa, Victor Erice, Aki Kaurismäki e Manoel de Oliveira é uma longa-metragem realizada no âmbito de Guimarães 2012 - Capital Europeia da Cultura e que reune quatro obras destes realizadores naquela que é uma homenagem não só à cidade do norte de Portugal como também um verdadeiro legado à memória e à identidade.
Centro Histórico inicia a sua viagem com o segmento de Aki Kaurismäki que através de O Tasqueiro nos remete para um dia na vida de uma tasca típica da cidade. Se inicialmente a oferta alimentícia para aqueles que a visitam se resume à mais básica "sopa do dia", não é menos verdade que a vontade de sobreviver e de atrair os muitos turistas que por lá se cruzam se torna numa fatalidade que levam o seu caricato dono a procurar evoluir e oferecer um cada vez melhor menu que, na realidade, nunca chega a satisfazer na totalidade.
Sweet Exorcism, é o segundo segmento de Centro Histórico e desta vez aquele que é da autoria de Pedro Costa que nos leva numa verdadeira viagem às profundezas da memória e de um pesado trauma de guerra que esta suporta. Ventura (um "não actor" que Pedro Costa recupera do seu magistral Juventude em Marcha) ouve o seu nome dito pelos fantasmas do seu passado em África. As suas pesadas vozes atormentam-no e impedem-no de uma existência pacífica que é vivido num ruidoso silêncio. No hospital entra no elevador e sentimos claramente que aquele espaço minúsculo mais não é do que uma vivida representação de um purgatório onde o aguarda um soldado. Esta clara alusão a um barqueiro que o transporta para o "outro lado" atormenta a sua existência com as memórias pouco claras desse passado em guerra colonial, de uma viagem para Portugal e de uma vida que o próprio já não sabe se viveu ou se mais não foi do que o fruto de uma imaginação outrora fértil.
O terceiro segmento chega-nos pelas mãos de Victor Erice que em Vidros Partidos recupera a memória de uma antiga fábrica têxtil no norte de Portugal, agora desactivada, bem como daqueles que ao longo dos anos passaram boa parte da sua vida nela. Desda as memórias cómicas às mais dramáticas não esquecendo aqueles que figuram numa curiosa fotografia do refeitório que mostra os olhares de tantos e que ainda se encontra na parede, Erice leva o espectador de Centro Histórico numa verdadeira e emotiva viagem no tempo que conseguiu recolher uma espontânea salva de palmas dos espectadores que se encontravam no São Jorge mesmo antes do filme terminar.
Finalmente o último segmento de seu título O Conquistador Conquistado chega-nos pelas mãos do mestre Manoel de Oliveira que num tom de comédia mordaz nos mostra como o outrora conquistador e fundador de Portugal é agora ele próprio conquistado pelos inúmeros turistas que vagueiam pelas ruas de Guimarães, transformando-se assim numa outrora figura imponente que é agora dominada pelas centenas de máquinas fotográficas sedentes de registar a sua estátua.
Ainda que não exista aparentemente um elo de ligação entre os quatro segmentos há algo que, apesar de "invisível" une todas estas histórias... a memória. É esta que se encontra presente em todas os grandes segmentos que compõem Centro Histórico, e é graças à genialidade dos quatro realizadores, também argumentistas dos seus próprios segmentos, que esta vive e perdura. Seja através da memória do espaço reflectida em O Tasqueiro, da História colectiva presente em Sweet Exorcism e em O Conquistador Conquistado, ou mesmo a memória pessoal tão bem descrita pelos relatos daqueles que trabalham na fábrica têxtil que o segmento Vidros Partidos, possivelmente o mais emotivo, transmite ao espectador.
Assim sendo, é este registo da memória, quer pessoal quer colectiva, de um mesmo espaço geográfico que dão vida não só à História como às histórias que compõem toda uma vivência comum de um povo que se formou e que ainda hoje subsiste como um dos mais antigos da Europa. Afinal não será este mesmo registo e a memória o único testemunho da passagem de cada um de nós pela vida independentemente de não registar individualmente o nome de cada um de nós?!
Não sei até que ponto a afirmação de João Lopes, coordenador do projecto e aquele que o apresentou no Cinema São Jorge, em Lisboa aquando da sua exibição ontem, sobre este ser o "maior filme do século XXI" estará correcta pois pessoalmente chegam à minha própria memória alguns outros títulos (portugueses e não) que poderiam facilmente ocupar este mesmo lugar mas, no entanto, não lhe tiro razão no sentido que quis dar à sua observação. Numa época em que o revisionismo histórico parece ser o mote do dia e em que um conjunto de conhecimentos que sempre tivemos como certos e apurados são colocados em causa, especialmente nestes dias em que Portugal celebra os seus quarenta anos de liberdade e fim da ditadura cujos efeitos são tão bem representados neste próprio filme através do segmento de Pedro Costa, "Sweet Exorcism", a questão que se deve colocar não é tanto se este não será o melhor filme do século mas sim aquele que nos coloca numa posição de perceber que a memória, e o seu devido registo e legado, são dos patrimónios mais importantes que a Humanidade alguma vez obterá. Caso contrário quem explicará não só a nossa passagem como aqueles feitos que um dia testemunhámos?!
Com argumentos mordazes que oscilam entre a comédia e o drama intenso, Centro Histórico conta ainda com uma das interpretações que aí sim, eu próprio coloco entre as mais fortes do século XXI (correndo o risco de também aqui poder eu ser apontado como exagerado). Ventura, no segmento Sweet Exorcism, encarna solidamente na sua interpretação os traumas sofridos durante a guerra, as alucinações com as vozes do seu passado que nunca pararam de o atormentar, e a solidão vivida por uma vida que nunca foi completa... sem ser pai, marido ou amigo, o seu Ventura aborda um tema que até à data ainda não foi devidamente explorado pelo cinema português, ou seja, como regressaram psicologicamente aqueles que atravessaram a guerra colonial? Se por um lado temos os mais variados registos norte-americanos sobre aqueles que passaram a guerra do Vietname ou, mais recentemente, a do Iraque, não é menos verdade que sobre o passado colonial português e o conflito armado de mais de uma década não temos qualquer registo assumidamente propositado.
Aqui Pedro Costa não poupa nos tormentos e exibe um homem perseguido por um passado que só ele conheceu, memórias perdidas no tempo mas que a sua psique registou sem esquecer obrigando-o a por entre elas navegar e perdendo-se na imagem de um homem que já não é. Por ele os anos passaram, pela sua memória não. Ventura é um homem desgastado, amedrontado e cuja pequena grande viagem de elevador lhe serve como expiação desse passado que vive no silêncio dos seus pensamentos e apenas provocados pela imagem daquele soldado (o barqueiro) que o conduz ao outro lado do "rio". Muito forte ao ponto de provocar calafrios no espectador, Costa e Ventura conseguem fazer o único e muito fiel marco que aborda os traumas de guerra num sentido, dramático e profundamente intenso segmento que toca de muito perto o terror psicológico.
Centro Histórico é um filme ainda sem estreia comercial no nosso país, o que por si só é um registo trágico, e assumidamente uma enorme pérola por descobrir que uma organização perspicaz e atenta do IndieLisboa soube finalmente trazer até à capital naquele que é possivelmente um dos mais fortes filmes de todo o festival e seguramente um dos melhores registos cinematográficos portugueses dos últimos largos anos.
.
.
"Inês Ferreira Gomes: Ansiamos por poder dizer "acabei"!"
.
10 / 10
.
.

Zombies4Kids (2014)

.
Zombies4Kids de Pedro Santasmarinas, realizador de Banda Desenhada, Auguste e M Is for Mail, é uma curta-metragem portuguesa de animação presente na secção IndieJúnior 2º Ciclo/+9 Anos, do IndieLisboa.
Através de uma pequena, hilariante e bem ritmada melodia, Zombies4Kids assume-se, tal como a própria tagline anuncia, como um pequeno guia de sobrevivência a um ataque zombie feito propositadamente para crianças. Mas atenção, cuidado com o que se cruzam pois... "if it has grey hair...", provavelmente não é um zombie.
Pedro Santasmarinas cria assim uma curtíssima de um minuto que, ainda que totalmente competente, nos deixa com aquele gosto de que queremos ver mais deste guia e possivelmente de algumas das dicas de sobrevivência que nele poderiam constar, tornando-se assim num dos filmes obrigatórios da secção júnior desta edição do IndieLisboa.
.
8 / 10
.
.

Pedro Cunha

.
1980 - 2014
.

IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente 2014: destaques para o quinto dia

.
Chegados ao quinto dia do IndieLisboa, os destaques vão para a Competição Internacional de Curtas 4, a decorrer no Pequeno Auditório da Culturgest, às 16h30. Em Pouco Mais de Um Mês André Novais Oliveira (que também realiza o filme) e a sua namorada retratam o momento em que dois amantes se conhecem, na curta Que Je Tombe Tout le Temps?, de Eduardo Williams, um jovem parte à procura de uma semente exótica, em Prehistoric Cabaret, de Bertrand Mandico, assistimos a uma colonoscopia de uma mulher em palco, Symphony no. 42 apresenta a interação dos homens com a natureza, através dos escritos de Darwin, uma animação realizada por Reka Bucsi e o último filme da sessão é Working to Beat the Devil, um documentário de Chu-Li Shewring e Adam Gutch sobre Guy Shewring, cientista que tenta descobrir os segredos da criação da vida.
Gilles Deroo e Marianne Pistone realizam Mouton, outro dos destaques de amanhã, em exibição na sala 3 do Cinema São Jorge a partir das 18h45. Nesta longa metragem ficamos a conhecer "Mouton", um rapaz emancipado da sua mãe por ordem judicial, que inicia a sua independência como aprendiz de cozinha no restaurante de uma pequena vila costeira da Normandia. De um realismo e uma sensibilidade impressionantes, Mouton certamente conquistará o público atento à Competição Internacional.
Às 19h, na sala 1 do Cinema City Campo Pequeno mostramos Pinta, um filme de Jorge Alencar, uma comédia “erótica pornochanchesca” na qual o realizador prova que não há limites para as experiências com cinema. Na sala 3, às 22 horas assistimos a outro objecto pouco convencional - L for Leisure, de Lev Kalman e Whitney Horn, é uma comédia carregada de ironia que retrata as férias de vários estudantes no ano lectivo de 1992-1993. Estes dois filmes integram a secção Cinema Emergente.
Destaque ainda para Double Play: James Benning and Richard Linklater, destaque da secção Director’s Cut, um documentário de Gabe Klinger que retrata a amizade entre os dois cineastas americanos e que pode ser visto às 19h na Cinemateca Portuguesa.
.

domingo, 27 de abril de 2014

PDL - LIS (Ponta Delgada - Lisboa) (2012)

.
PDL - LIS (Ponta Delgada - Lisboa) de Diogo Lima é um documentário português em formato de curta-metragem que nos mostra a reflexão do jovem realizador sobre o facto de regressar a casa (Ponta Delgada) depois de lá ter saído rumo a Lisboa para continuar os seus estudos.
Que relação existe com uma terra com a qual, pelos seus próprios relatos, sempre manteve um distanciamento como se dali não pertencesse? O que lhe diz sentimentalmente uma terra onde nasceu e onde toda a sua família e amigos se encontram mas que pela força do destino e das distâncias parece estar cada vez mais longe quer física quer psicologicamente?
É com estas premissas que o jovem realizador Diogo Lima nos apresenta este documentário que para além de ser um registo documental sobre os espaços e os lugares físicos é, acima disso, um registo sentimental onde o próprio procura um espaço que possa considerar seu e que de uma ou outra forma detenha a marca da sua passagem.
Se por um lado percorre os locais que o viram crescer e que estão gravados na sua memória como fazendo parte de toda a sua vida, não é menos verdade que esta viagem que faz lhe conferem um conjunto de sentimentos e sensações conflituosos entre si. Sim, é o local onde passou a sua infância, onde tem a sua família e onde formou os seus amigos mas, ao mesmo tempo, até que ponto este lugar lhe confere alguma espécie de identidade?
Assim de forma muito intimista pois acompanhamos os pensamentos de Diogo desde o primeiro instante, conhecemos a sua opinião sobre um dos elementos que poderia muito provavelmente entregar-lhe um próprio sentimento de pertença; o seu sotaque. Diogo Lima distancia-se imediatamente dele afirmando que é "a coisa mais feia de sempre". Não poderia discordar mais pois são estes simbólicos marcos que nos definem e nos entregam um certo elemento de pertença, seja lá qual fôr o local, mas por outro lado compreendo esta aversão quando o próprio revela a falta de identificação com o local que o viu nascer.
Aos poucos percebemos e identificamos também os efeitos que a própria distância física cria em Diogo quando através dos seus pensamentos percebemos que com alguns elementos da família já procura conversa de circunstância que alimente mais alguns minutos de diálogo ou com os próprios amigos, aqueles com quem possivelmente partilhou um conjunto de experiências que mais ninguém lhe poderia proporcionar, com os quais parece já não ter grandes assuntos em comum.
É esta dualidade que PDL - LIS (Ponta Delgada - Lisboa) criam no espectador deixando-o inclusive com uma ligeira sensação de que ele próprio se sente desconfortável num lugar novo e desconhecido que, por muito belo que seja ou por muitos elementos identificativos que possa eventualmente ter é, na prática, uma terra onde não queremos estar. "Aos poucos as pessoas afastam-se", diz a certa altura sobre a crescente distância que sente, mas ao mesmo tempo reconhece que os Açores são o único local onde sabe que pode recorrer pois tem lá quem lhe seja próximo, talvez o único local onde alguma vez possa dizer que está o seu "lar". Diz-se que os grandes génios, ou talvez aqueles mais conturbados, são os que vivem um grande conflito com o local de onde provêm. É nessa medida e com este pensamento como base que posso afirmar que apesar deste ser um documentário quase "amador", colocado entre aspas pois as suas reflexões denotam que de tal tem muito pouco, consegue ainda assim ser um interessante e sentido registo sobre as raízes do Homem... aquelas que o definem mesmo que lhe sejam ingratas, as que o marcam mesmo que seja involuntariamente e que mesmo não querendo lhe deixam recordações que jamais irá poder esquecer.
Íntimo e pessoal, PDL - LIS (Ponta Delgada - Lisboa) cativa pela quase involuntária emotividade com que este jovem realizador (de quem espero poder ver novos trabalhos) filma a sua terra, a sua gente e a sua família, naquele que é um sentido e bonito reencontro surpresa com quem brinda o espectador ao deixar entrar-nos dentro do seu próprio lar.
.
.
8 / 10
.

IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente 2014: destaques para o quarto dia

.
O quarto dia do IndieLisboa começa com programação para miúdos e os graúdos que os acompanhem, com o destaque para a Festa de Aniversário do IndieJúnior, a partir das 16 horas no jardim do Palácio Galveias. A secção júnior do IndieLisboa está a ficar crescida e comemora este ano o seu 10º aniversário com uma série de actividades e uma sessão especial de cinema para os mais novos. Realizado por Raúl Perrone, P3ND3JO5 tem Buenos Aires como plano de fundo, e é sobre os fantasmas e skaters desta cidade (14h45 Cinema City Campo Pequeno, sala 3). Na mesma sala, às 21h45, propomos La Marche à Suivre, um documentário de Jean-François Caissy que acompanha a vida escolar de um grupo de jovens problemáticos do Norte do Quebeque.
No Pequeno Auditório da Culturgest passa, às 16h45, a Competição Internacional Curtas 2 que inclui quatro filmes: A Caça Revoluções, de Margarida Rêgo, explora a relação entre duas gerações com a Revolução de Abril como inspiração, em Lição de Esqui, de Leonardo Mouramateus e Samuel Brasileiro, é posta à prova uma amizade entre dois rapazes que querem aprender a esquiar no Canadá, Mille Soleils é uma homenagem de Mati Diop a Touki Bouki, realizado pelo seu tio, Djibril Diop Mambety e em Reign of Silence, de Lukas Marxt, vemos a acção do homem sobre a natureza e o regresso da paisagem à normalidade. Destaque ainda para a segunda sessão de curtas da secção Pulsar do Mundo (18h45, Cinema São Jorge, sala 3) com três documentários e uma ficção: Village Módèle, de Hayoun Kwon, é inspirado na cidade propaganda norte-coreana de Kijong-dong, Em Trânsito, de Marcelo Pedroso, mostra o crescente número de carros existentes na cidade do Recife, como exemplo de progresso mas com sérias consequências para a vida da população, Crop, de Johanna Domke e Marouan Omara, retrata a Primavera Árabe por alguém que não a viveu de perto e La Voce di Berlinguer, de Mario Sesti, apresenta o discurso do lendário secretário nacional do Partido Comunista Italiano, proferido em Turim, em 1981.
Pelas 18 horas no Cinema São Jorge há a destacar a exibição de Centro Histórico, de Pedro Costa, Manoel de Oliveira, Victor Erice e Aki Kaurismaki e finalmente destaque ainda para Obvious Child, de Gillian Robespierre, a história de Donna Stern (Jenny Slate), uma comediante cuja vida dá uma enorme volta quando, deixada pelo namorado, se envolve com um rapaz que em nada tem a ver consigo - a não perder às 21h45, na Sala Manoel de Oliveira do Cinema São Jorge. A noite continua no IndiebyNight, numa festa de entrada livre no Primeiro Andar, espaço oficial do IndieLisboa’14, a partir das 23h.
.

sábado, 26 de abril de 2014

Les Grandes Ondes (à l'Ouest) (2013)

.
As Ondas de Abril de Lionel Baier é uma longa-metragem em co-produção luso-franco-suíça presente no âmbito do IndieLisboa e que melhor dia para ser exibida do que no próprio dia 25 de Abril sobre o qual versa a sua acção.
Quando em Abril de 1974, Julie (Valérie Donzelli) uma dedicada feminista, Cauvin (Michel Vuillermoz) um repórter de guerra que agora sofre com os efeitos da perda de memória e Bob (Patrick Lapp) um técnico de som, são enviados a Portugal para uma reportagem sobre a ajuda e apoios monetários suíços ao país, estavam longe de imaginar que se encontrariam no centro da Revolução dos Cravos que iria, de uma ou outra forma, alterar radicalmente as suas próprias vidas.
Com o apoio de Pelé (Francisco Belard), um jovem que os assiste nas suas entrevistas e muita vontade de levar de volta à Suíça algo consistente, percebem que as mesmas em nada os auxiliam decidindo que está na altura de regressar sem material suficiente... até que de repente são alertados para a revolução que estalou em Lisboa para onde decidem partir e tentar captar imagens que lhes garanta um regresso vitorioso.
Lionel Baier e Julien Bouissoux escrevem este argumento baseado em acontecimentos verídicos de uma forma simples e bem disposta mas que de uma maneira muito peculiar consegue captar a essência e o espírito do momento.
Qualquer um de nós quando depara com uma peça sobre o 25 de Abril retém de imediato o fim do regime austero e ditatorial que estão inerentes ao mesmo mas nunca, de forma alguma, ousa pensar que aos olhares do século XXI muitos destes momentos só poderiam ser encarados com algum humor e boa disposição a que o próprio relato nos obriga. Sem esquecer o peso do regime, Baier e Bouissoux concentram-se não tanto na austeridade da época mas sim em pequenos e caricatos momentos que caracterizam a falta de comunicação entre suíços e portugueses que levam a alguns dos momentos mais bem dispostos e sui generis deste filme, e para o qual contribui de forma decisiva a interpretação de Vuillermoz. Somos assim levados a um conjunto de entrevistas que prezam pela caricatura de um regime que se pensava imperial e magnânimo, mas que na prática apenas contribuiu para uma enorme dose de ignorância e miséria por parte do seu povo que, ainda assim, sempre se sentiu no dever de bem receber e agradar sem se questionar daquilo que realmente era ou representava. Mesmo por detrás de cada momento mais cómico existe um laivo de tristeza e solidão que, sendo tão portugueses, são tão bem retratados, e de forma fiel, por um suíço.
Não esquecer ainda o olhar aguçado feito aos "homens do regime" do Portugal de então. Desde o professor amável mas tirânico, ao operário que não querendo alguém de "outras raças" (num brilhante registo de José Eduardo), não deixa de os ter por perto para o servir, ou até mesmo a ridicularização que se exerce neste filme aos PIDE's através de um dos momentos mais curiosamente bem dispostos de todo o argumento. Com um olhar distante, mas ao mesmo tempo tão próximo, Baier consegue cativar o espectador pela comédia depreciativa destas figuras mas ao mesmo tempo humanizadora para com um povo respeitando-o, e acima de tudo, ao espírito livre que surgiu com a queda de um dos mais brutos regimes do século XXI. Como o próprio disse no Cinema São Jorge aquando da apresentação do mesmo, "nos dias difíceis e perturbados que a Europa vive nada melhor do que poder ultrapassar as dificuldades (sor)rindo das mesmas e de todas as pequenas características que fazem de nós únicos". A percepção da importância desta história bem como do momento que atravessamos, e que atravessa a Europa no seu todo, esteve não só presente nesta apresentação de Les Grandes Ondes (à l'Ouest), assim como no próprio filme que termina com a referência de que de "Lisboa a Atenas os povos levantam-se contra a austeridade", o que tornou a sua exibição neste dia um elemento bem positivo para o mesmo e para aqueles que a ele assistiram.
Donzelli, Vuillermoz, Lapp e Belard fazem um quarteto perfeito. Rodeados de bastante humor e pequenas doses de drama como reflexo das suas vidas, este conjunto de actores consegue humanizar não só a história como principalmente as vidas daqueles que representam. Enquanto os três primeiros sentiam, e precisavam, a necessidade das suas vidas voltarem a ter um novo propósito e rumo, o "Pelé" de Belard representa aquele que desesperadamente sabia que o seu futuro seria inexistente e, tal como tantos outros, estava já empenhado e perdido numa guerra que o iria para sempre transformar. Marcante, para mim, o momento em que após passada a fronteira com Espanha assiste a um jovem que, tal como ele, corre para um futuro que não sente ter e lhe responde com um simples mas premonitório e determinante "até já".
Se os momentos já "vividos" em Lisboa quase se aparentam a um sonho muito alternativo pelo retrato que Baier faz do momento, não é menos verdade que em muito corresponde aos próprios relatos que muitos de nós já escutaram sobre aquele dia vibrante. E se muitos hoje questionam a importância e a positiva relevância que o dia teve nas vidas dos de então, e nas daqueles que depois nasceram, não só o facto de poder estar a escrever este texto tão livre e descomplexadamente a comprovam como nos dias que actualmente atravessamos mais confirma que não só não deve ser esquecido como celebrado alegrando-me a mim perceber o importante significado de ter nascido em liberdade e de ver alguém não português a celebrar um dos mais importantes dias da História Mundial.
.
.
7 / 10
.
.

O Primeiro Verão (2014)

.
O Primeiro Verão de Adriano Mendes é uma longa-metragem portuguesa de ficção que teve a sua estreia na secção Novíssimos do IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente, que decorre pela capital até ao próximo dia 4 de Maio.
Isabel (Anabela Caetano) e Miguel (Adriano Mendes) são dois adolescentes que se conhecem na escola de condução. Após uma empatia inicial solidificada com o passar do tempo e a companhia de Cmyk, o cão de Miguel, os dois acabam por passar o Verão juntos e algo mais nasce entre ambos.
No entanto, chega o Outono e Miguel tem de visitar a família enquanto Isabel fica a cuidar de Cmyk. Quando Miguel regressa algo acontece que irá colocar a cumplicidade de ambos em risco e que os fará pensar se o seu amor será realmente tão forte quanto aquilo que o Verão viu nascer.
Esta que é a primeira longa-metragem de Adriano Mendes, que quer queira quer não acaba por ser o verdadeiro motor da execução deste filme ao assumir-se ainda como argumentista e principal intérprete, assume-se como uma obra frágil mas que, ainda assim, ostenta uma naturalidade e simplicidade que nos faz esquecer todos aqueles momentos que, noutro filme, seriam de apontar.
Esqueçamos o facto de ter um passo relativamente lento que o faz custar a "arrancar" com o desenvolvimento quer da história quer das suas personagens, e lancemo-nos naquilo que realmente o torna especial principalmente se considerarmos que estamos perante uma obra independente, que é como quem diz feita com poucos recursos e muita dedicação por parte daqueles que dela tomaram parte.
O Primeiro Verão torna-se assim interessante por vários aspectos sendo o primeiro deles a capacidade que tem em nos remeter para um mais ou menos ido, parafraseando, primeiro verão onde a vida de todos nós começa e onde experienciamos todos aqueles momentos que independentemente de terem ou não algo de verdadeiramente especial irão ficar registados nas nossas memórias... Aquele Verão em que deixamos a escola, em que tiramos a carta de condução e onde disfrutamos da época estival pensando que "sim... aquele será o último sem preocupações". É nesta perspectiva que temos de abraçar este filme e pensar que tal como nessa época... nada é perfeito. Tudo é vivido ao sabor do momento tendo apenas em mente que o próximo irá ser trabalhado, mais custoso mas ao mesmo tempo com mais entrega e igual dedicação.
Para este Verão muito contribui a química entre a dupla protagonista, Anabela Caetano na qual se centra grande parte da primeira metade do filme, na sua vida e nas suas tarefas ao auxiliar a mãe, interpretada pela própria mãe da actriz que muito naturalmente se posiciona como uma das figuras mais positivamente caricatas de O Primeiro Verão pela forma simples e, de facto real com que interpreta a sua "personagem", e do próprio Adriano Mendes que na sua sentida ingenuidade (que me pareceu ser um retrato de si mesmo graças à forma elegante, sentida e descomplexada com que apresentou a sua obra) ganha confiança à medida que a acção decorre. Se inicialmente notamos algum desconforto no "frente a frente" entre os dois, não é menos verdade que aos poucos a naturalidade surge de forma espontânea e ambos lidam com o comportamento que mutuamente entregam à história e crescem nas personagens que encarnam. E se Anabela Caetano tem a personagem central e dominante ao longo de todo o filme, não é menos verdade afirmar que aos poucos Adriano Mendes torna-se cada vez mais central e ocupa o espaço que lhe pertence com naturalidade.
A dinâmica entre os dois surge e sente-se. Percebemos que as suas personagens estão intimamente ligadas e que nada poderia existir naquele filme se não fosse um em função do outro mas, no entanto, ao escrever este comentário não posso deixar de referir aquele que assume um papel centralizador do filme, ou não fosse ele o "motivo" pelo qual "Isabel" e "Miguel" trocam as primeiras palavras... Cmyk, o cão. Não sei, nem tão pouco interessa, que treino teve para se manter sempre tão presente e "disciplinado", mas é um facto que Cmyk não só consegue "trabalhar" nos momentos indicados para aumentar a dinâmica do filme como ainda é o protagonista de alguns dos momentos mais hilariantes de toda a história e o centro de um dos momentos mais significativos e emocionantes de toda a história quando o jovem "Miguel" recorda em flashback todo o percurso que percorrera com ele.
No campo das personagens, há ainda que deixar uma marca pessoal à jovem de espírito avó de "Isabel" que não só se assume como o elemento cómico da história como, na suanão experiência na área consegue inserir-se como peixe na água e tornar os seus momentos como verdadeiros "ice breakers" do argumento, numa aposta claramente ganha por parte de Adriano Mendes enquanto realizador.
Tecnicamente falando deixo ainda uma marca positiva à direcção de fotografia novamente numa clara referência ao trabalho de Adriano Mendes mas desta vez em parceria com Rui Mendes, o produtor do filme, que nos remete para um verão experienciado no norte do país onde as cores quentes da época se misturam com as paisagens verdejantes e sem nunca esquecer os enquadramentos das tradicionais festas locais que recebem os inúmeros emigrantes que regressam ao país.
Se O Primeiro Verão é um filme que ficará na história é algo que ninguém poderá afirmar. Talvez sim para aqueles que se tornem fãs e que queiram ver este jovem realizador crescer ou talvez não pela sua fragilidade técnica enquanto obra per si. No entanto avaliando este filme como um trabalho dedicado e em que os intervenientes mostraram uma clara entrega àquilo que quiseram fazer e apresentar ao público, dessa aposta sai uma obra claramente vitoriosa e que para Adriano Mendes se torna numa prova que conseguiu superar não pelos conhecimentos técnicos que lhe (tentou) aplicar mas sim pela genuinidade e entrega com que o fez.
.
7 / 10
.
.

IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente 2014: destaques para o terceiro dia

.
O terceiro dia do IndieLisboa é marcado pela exibição de The Filmballad of Mamadada, de Cassandra Guan e Lily Benson numa homenagem à Baronesa Elsa von Freytag-Loringhoven, dadaísta que derrubou as barreiras entre a arte a vida. Para esta longa metragem, exibida às 15h no Pequeno Auditório da Culturgest, participaram mais de 50 artistas que interpretaram momentos da vida da baronesa. Logo de seguida, na mesma sala, às 16h45, tem início a sessão de curtas metragens da secção Cinema Emergente: Little Revolutions, de Marie Constantinesco, que retrata o quotidiano e os momentos em família, A Million Miles Away, de Jennifer Reeder, que nos conta a história de uma professora e de um grupo de adolescentes, suas alunas, e do processo necessário para superar o fosso entre as duas gerações, Man Kann Nitch Alles Auf Einmal Tun, Aber Man Kann Alles Auf Einmal Lassen, de Marie-Elsa Sgualdo, é uma carta visual a José-Luís Guerin, Kurdrjavka, de Risto-Pekka Blom sobre o lançamento da cadela Laika ao espaço, e finalmente Jerry & Me é uma obra da iraniana Mehrnaz Saeedvafa centrada em Jerry Lewis. Também às 16h45, na sala 3 do Cinema City Campo Pequeno passa o documentário de Vincent Dieutre, Orlando Ferito, que retrata a Sicília actual, uma Sicília que poderia servir de metáfora para a Europa dos dias de hoje. De seguida, às 19h30, mostramos Deux Fois Le Même Fleuve, de Amir Borenstein e Effi Weiss, a viagem dos dois artistas visuais que recriaram o percurso de John McGregor ao longo do Rio Jordão.
Igualmente imperdível é My Prairie Home, de Chelsea McMullan, às 23h45 na sala 3 do Cinema São Jorge, um documentário biográfico sobre Rae Spoon, baseado no livro da cantora First Spring Grass Fire. Europe in 8 Bits, da secção IndieMusic, dá o mote para a festa que se prolonga pela noite fora no Primeiro Andar, ao som do DJ set de Meneo, com início às 23h00.
.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Los Amigos Raros (2014)

.
Los Amigos Raros de Roberto Pérez Toledo é uma longa-metragem espanhola que afirmo com segurança, ser um daqueles filmes que consegue marcar enquanto filme de uma geração... seja ela qual fôr.
Sam (Adrián Exposito), era o aluno mais destacado da faculdade e aquele que todos admiravam pela sua excelência e competência académica. Um dia morre, e todos aqueles que privaram de perto com ele falam sobre a forma como a sua singular amizade se formou e como se desenvolveu levando aos mais diversos e inesperados desfechos que de uma ou de outra forma os marcou incondicionalmente.
À vez, o aprimorado argumento de Roberto Pérez Toledo leva-nos a conhecer as nove mais significativas amizades de "Sam" e as relações mais ou menos tempestivas que viveram, desde o amor ao ódio, da violência à indiferença, todos eles têm um conjunto de situações, momentos e palavras que nos mostram que estas amizades foram tudo menos pacíficas, e que mesmo aquelas que prezaram pela tranquilidade denotam que a sua mais íntima essência resultou de relações marcantes para qualquer um deles.
Assim num estilo que oscila entre um confessionário onde somos apresentados a cada uma das nove personagens, Pérez Toledo leva-nos a conhecer estes "amigos raros" que têm de sua justiça muito a dizer sobre "Sam", aquele que todos admiravam e do qual sentem falta, através de um conjunto de reveladores flashbacks que nos mostra o que acontecia por detrás das quatro paredes em que conviviam.
Se para Rod (Néstor Losán), Sam era aquele colega e mentor que admirava e o único que lhe poderia conferir algum conhecimento e experiência para a sua própria formação profissional (ambos são cineastas), Gero (Dani Herrera) sentia-se privilegiado apenas por poder privar com Sam e com ele trocar umas breves palavras, sendo que no seu íntimo, e tal como faz notar Lídia (Laura Díaz), ambos sentem por ele mais do que uma amizade e desejam senti-lo, tê-lo e possuí-lo fisicamente.
É este sentimento de paixão que acaba por ser vivido, de forma distinta, com três dos seus amigos... com Óscar (Ventura Rodríguez), aquele que por ele sentiu mais proximidade e entrega mas também aquele que mais maltratado foi por Sam, com Manu (Javier Zapata) com quem apesar de viver uma relação estritamente física denotou conhecê-lo melhor que ninguém e finalmente com Cris (Violeta Orgaz), sua amiga de infância e possivelmente aquela que por entre muito mistério melhor o conheceu ao ponto de ver em Sam a sua potencial maternidade.
Finalmente temos ainda Paloma (Andrea Duro) que por Sam denotou uma total dependência, Joan (Román Reyes) que apesar de se sentir atraído por ele não se iria deixar maltratar e finalmente Gabi (David Mora), que por Sam demonstra ter uma daquelas amizades cúmplices a quem tudo se pode revelar.
O que cativa em todas estas personagens que compõem os amigos de "Sam" é a capacidade de todos eles terem um ou outro pequeno elemento que podemos identificar no nosso próprio comportamento. Todos nós, ainda que talvez secretamente, já tivemos uma empatia, admiração, identificação ou até mesmo atracção por alguém que compõe o nosso círculo de amigos mas, ao mesmo tempo, todo e qualquer sentimento que por essa pessoa era sentido estava, ao mesmo tempo, ou bastante reprimido para não ser identificado ou então era explorado para ver se mútuo.
São eles, através dos seus testemunhos, que ficamos a conhecer não só o tipo de relação que tinham, na sua maioria caracterizados por um elevado grau de dependência, sob as suas mais variadas vertentes e que os marcou de forma quase irreparável. Se por um lado temos aqueles que viam em "Sam" um amigo com o qual podiam contar nas horas mais complicadas não esperando mais dele do que uns instantes do seu tempo de forma a colmatar aquela falta de atenção que pudessem sentir ou para poder ultrapassar um momento mais difícil, como são disso exemplo os casos de "Gabi" e de "Cris", não é menos verdade que muitas destas relações mais não eram do que casuais, físicas e inconsequentes, estando mesmo intimamente compostas de alguma violência emocional e psicológica.
São estas ligações, afectivas ou físicas mas todas elas de extrema dependência, que se revelam logo após o suicídio de "Sam", aquele tipo que todos admiravam e do qual queriam estar próximos. Proximidade esta da qual fugia a sete pés como se o limitasse na sua condição. No entanto, ao mesmo tempo somos levados a questionar quem realmente era ele. O que o motivava? Brilhante na sua área académica e a reunir a admiração de todos mas que, ao mesmo tempo, desprezava qualquer tipo de intimidade que lhe pedisse uma explicação ou um "porquê". Somos levados a questioná-lo (e a nós) sobre as reservas e asperezas que cria como uma defesa sobre quando alguém diz que o ama, que quer a sua companhia e presença e que o mundo faz sentido com ele por perto. Ao mesmo tempo, questionamos até que ponto é esta vontade um sentimento meramente de amizade e analisamos estas relações enquanto aquilo que elas realmente são... relações pouco claras, iniciados no calor de vários momentos sexualmente tensos ou reprimidos e, como tal confusos, nos quais os afectos normalmente não são correspondidos mas sim receados, repletos de ciúme, de posse e de invejas que limitariam a sua saudável exploração. Estes amigos são raros (estranhos na tradução correcta), não pela sua dedicação mas sim pela forma como esta rapidamente se transforma em perturbação e dependência mórbida como se a vida de alguns deles não existisse para lá de "Sam".
Há sempre uma certa dificuldade em comentar um filme do qual se gosta e pelo qual se sente uma empatia imediata ao ponto de dizermos "este é um dos filmes da minha vida", por isso muito este comentário seja talvez disperso e, também ele, confuso mas ao mesmo tempo isto acontece porque para além de existir uma identificação imediata com algumas das suas personagens, existem também um conjunto sem fim de ideias e pensamentos que surgem na cabeça e que se desejam desesperadamente colocar "no papel".
Ao ver Los Amigos Raros lembro-me imediatamente de The Breakfast Club, de John Hughes que exerceu uma elevada legião de fãs com a juventude dos anos 80 do século passado graças à forma como aborda as problemáticas teen de então, desde o suicídio à aprovação parental sem esquecer o "dia de amanhã" que ocorre logo quando o secundário termina, conseguindo assim um estatuto de filme de culto para o futuro. Los Amigos Raros insere-se igualmente nesta linha dita de culto, e é seguramente um daqueles títulos que, tendo alguém que aposte nele (espero que sim), será para aqueles que tendo hoje 25/35 anos, um filme que irá marcar pela capacidade que tem no seu conteúdo de identificar e marcar diversos comportamentos que os mesmos têm e por tecer sérias considerações e reflexões sobre os dias e as relações do presente, sobre a dignidade e a entrega, sobre a humilhação e o desespero, e principalmente sobre a forma como cada um se coloca face ao outro quando dele gosta ou ama, assim como face à vida (ou à forma de viver) e à morte.
Pérez Toledo explora de forma arriscada, a forma como as pessoas se unem ou separam bem como o medo constante de se entregarem a alguém ou de revelar os seus sentimentos, quase preferindo morrer a fazê-lo visto que a ideia de partilhar a vida com uma outra pessoa ganha contornos assustadores quando parece poder confirmar-se. Assim em Los Amigos Raros explora de uma forma diferente e original as interacções humanas ao colocar todos os seus intervenientes não num confronto entre si mas sim a confessarem os seus momentos, os seus erros e aquilo que fizeram devido ao sangue quente que lhes corre nas veias e que os move por se exporem sem condições ao "outro" como se de um ritual de passagem se tratasse.
Ritual este que Pérez Toledo explora com base no sentimento mas alienando-se do seu sentido mais filosófico entregando-se ao mais carnal, de forma bruta e sem compaixão, sincero mas mordaz... Será que todos aqueles nove amigos desejavam realmente "Sam" ou apenas a ideia de poder tê-lo pelo que de mais animalesco este lhes provocava? Seria ele assim tão frio e indiferente ao que os outros sentiam ou apenas alguém que percebeu ser tudo demais para aguentar... o amor, o ódio, a tortura psicológica e emocional, a proximidade bem como o afastamento e a separação, a entrega, a devoção e a dedicação ou até mesmo a constante aprovação que lhe pediam... "Sam" teve de tudo... de todos... constantemente... como uma pressão sem tréguas e sem limites sem nunca, no entanto, ser questionado sobre quem ele é... o que deseja... o que planeia... como se vê... o que espera.
E falar da qualidade do argumento é ter obrigatoriamente que referir aqueles que lhe dão vida. As palavras de Pérez Toledo são interpretadas com maestria por um conjunto dos novos, e espero duradouros, talentos no campo da interpretação de nuestros hermanos. Se Adrián Exposito cria um atípico protagonista com o seu "Sam" que está no centro de todos as atenções mas que acaba por funcionar como um elemento quase não presente (todos falam dele mas apenas como uma referência ao que "foi" e não ao que "é"), não é menos verdade que o restante elenco representa aquilo que de melhor e pior tem a ideia de "relação humana". Desde a dependência extrema emanada nos dois polos "Lídia"/"Gero" pelo seu lado físico em sólidas interpretações de Laura Díaz e Dani Herrera que se expoêm como aqueles que vivem um desejo ora verbalizada ora reprimido, ou de um "Rod" de Néstor Losán que o deseja pela vertente criativa sem querer saber quem "Sam" realmente é, há ainda que notar o amor sentido por parte de "Óscar" num registo muito emotivo de Ventura Rodríguez que se despe de qualquer preconceito para mostrar o que um amor não correspondido e, acima de tudo, desprezado pode gerar nos futuros e potenciais relacionamentos, ou o "Manu" de Javier Zapata que mostra como pode existir uma atracção física que pode originar um amor livre de interesses externos para além do "quem será a outra pessoa?", mas que graças a uma mente já desgastada pela pressão nunca se chega a concretizar, ou o "Joan" composto por Román Reyes como alguém que já tem o seu próprio passado e não quer sair mais marcado, sem esquecer a "Paloma" de Andrea Duro que tem tanto de trágico como de cómico por se revelar como alguém que espera desesperadamente por alguém que goste tanto dela... como ela do outro, e que nas suas mais diferentes formas desde o depende do primeiro, ao curioso do segundo, passando pelo desprendido e o humilhante dos dois últimos caracterizam tudo aquilo que de bom e mau pode ter uma relação a dois. No entanto, falar deste magnífico elenco é não esquecer obrigatoriamente as personagens "Gabi" e "Cris" interpretadas por David Mora e Violeta Orgaz respectivamente, ou seja aqueles que representam os dois expoentes máximos do Homem... a vida e a morte. Se David Mora personifica a morte, ou pelo menos a sua alusão mais real ao revelar a forma como se aproximou de "Sam" e nele depositou toda a sua máxima confiança, temos por sua vez Violeta Orgaz que o procura como forma de dar continuidade à vida... à descendência. É através destas duas magníficas interpretações que ficamos a conhecer que para "Sam" o fim está próximo sendo que é dele que também existirá uma continuidade que poderá marcar pela diferença a vida daquela que talvez melhor o tenha conhecido... o "Sam" que esteve longe da ribalta, da admiração e da pressão que lhe estava inerente. Vida e morte chocam ao longo deste filme graças a estas duas interpretações repletas de honestidade e emotividade no seio de uma história que se queria a falar de relações sem cair no sentimento mas que obrigatoriamente dele não escapa.
E depois de um comentário que poderia ainda ter tanto por dizer (e tem) percebo que tudo isto foi realizado em apenas treze horas e com poucos meios, mas tudo dirigido de forma profissional, com a entrega de uma equipa que acreditou neste projecto e cujos resultados estão à vista como um dos melhores filmes espanhóis dos últimos tempos e seguramente um dos mais fortes deste ano que, independentemente dos prémios que lhe poderão ser atribuídos (ainda que não atestem a verdadeira qualidade de um filme, mas que não é menos verdade que abonariam em favor do mesmo), constitui-se Los Amigos Raros como aquele que deveria ser um dos preferidos aos ditos prémios quando se celebrar o que de melhor este ano fez "nascer"; não só um filme que ficará na memória dos espectadores sem de lá sair, como a confirmação de jovens talentos do cinema espanhol como o realizador e argumentista Roberto Pérez Toledo e um conjunto de jovens actores onde se destacam Expósito, Mora, Orgaz, Rodríguez e Zapata (se os Goya quiserem premiar cinema independente, aqui estão várias apostas seguras).
No final resta-me apenas acrescentar a referência ao pensamento que "Sam" dizia e que "Gabi" relembra... "a tristeza não tem nada a ver com lágrimas"... de facto não tem e Los Amigos Raros bem lhe dá enfoque... a tristeza é simplesmente o estado a que alguém chega quando percebe que o mundo que o rodeia o sufucou de tal forma que já não consegue perceber se consegue aguentar ou chegar até ao dia seguinte... Dia esse a que alguns realmente não chegam.
.
.
"Gabi: (sobre Sam) La tristeza no tiene nada que ver com lágrimas."
.
10 / 10
.

V Troféus TV 7 Dias: os vencedores de 2014

.
Foram atribuídos no passado dia 22 de Abril no Casino Estoril os Troféus TV 7 Dias que já vão na sua quinta edição e que premeiam, através do voto do público, aquilo que de melhor se faz em televisão.
O CinEuphoria deixa aqui referência aos vencedores nas categorias de Ficção e respectivos prémios honoríficos que destacaram a relevância dos melhores profissionais na mesma área. São eles:
.
Telenovela: Belmonte, TVI
Actor Principal: Pedro Teixeira, Destinos Cruzados
Actor Elenco: João Perry, Sol de Inverno
Actriz Principal: Maria João Luís, Sol de Inverno
Actriz Elenco: Manuela Maria, Mundo ao Contrário
Música de Genérico: "Amor com Amor se Paga", de André Sardet, em Belmonte
Série: Bem-Vindos a Beirais (Bruno José e Nuno Marvão prods.), RTP1
Actor Série: Pepê Rapazote, Bem-Vindos a Beirais
Actriz Série: Oceana Basílio, Bem-Vindos a Beirais
Programa de Humor: Gang dos Cotas, TVI
Actor/Humorista: Herman José, Herman 2013
Actriz/Humorista: Luciana Abreu, Sol de Inverno
Prémio Prestígio: Eunice Muñoz
Prémio Revelação: João Paulo Rodrigues
Prémio Realização: Hugo Sousa, Mundo ao Contrário
Prémio Memória: Luís Andrade
.
.

IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema Independente 2014: destaques para o segundo dia

.
Esta sexta-feira, que é marcada pelo 40º aniversário da revolução dos cravos o IndieLisboa’14 preparou uma programação onde constam dois filmes dedicados à temática do 25 de Abril. O primeiro é Les Grandes Ondes (à l'Ouest), realizado por Lionel Baier, e o segundo é Mudar de Vida, José Mário Branco, Vida e Obra, de Pedro Fidalgo e Nelson Guerreiro. Duas longas metragens que, através de diferentes abordagens, retratam esta época de forma única.
No Cinema City Campo Pequeno destacam-se, para este dia, três longas-metragens. Swim Little Fish Swim, de Ruben Amar e Lola Bessis (14h30, sala 1), apresenta-nos a jovem "Lilas", uma francesa a viver em Nova Iorque - a cidade que mais potencia a capacidade de sonhar, The Second Game, o mais recente filme de Corneliu Porumboiu, é apresentado às 19h15 na sala 3. Em The Second Game pai e filho - Adrian Porumboiu e Corneliu Porumboiu - revivem um jogo de futebol, decorrido há 26 anos, arbitrado pelo pai e que marcou as suas vidas. Dial M for Murder, realizado por Alfred Hitchcock em 1954, é a lendária sessão 3D do clássico que poderá ser vista às 21h30 na sala 1.
A primeira sessão de curtas-metragens da secção Cinema Emergente passa às 16h30, no Pequeno Auditório da Culturgest e mostra quatro filmes: Sottoripa, do realizador Guglielmo Trupia, retrata o bairro do centro histórico de Génova através de um poema de Julian Stannard, em Sattuman Syyt, parte-se da ideia de que os acasos conduzem a vida através de um rol de imagens que Virke Lehtinen, o realizador, filmou ao longo de 50 anos, a animação La Nuit Américaine d’Angélique, de Joris Clerté e Pierre-Emmanuel Lyet, baseia-se no filme La nuit Américaine de François Truffaut com recurso a desenhos simples e sombras chinesas, finalmente em Ponto Morto, uma ficção portuguesa de André Godinho, um casal a caminho das suas férias depara-se com uma mulher morta num acidente de carro e muda totalmente o rumo da sua viagem.
Em El Futuro, de Luis López Carrasco, filme da secção IndieMusic, vemos um grupo de jovens dançar e beber numa casa, num ambiente festivo onde se celebra a vitória eleitoral dos socialistas nas legislativas de 1982 espanholas, ao som de uma fantástica banda sonora - música new-wave espanhola dos anos 80. El Futuro passa às 23h45 na sala 3 do Cinema São Jorge.
A noite continua com a festa IndiebyNight no espaço oficial do festival, o Primeiro Andar da Culturgest.
.

Tribeca Film Festival 2014: os vencedores

.
World Narrative Competition
The Founders Award for Best Narrative Feature: Zero Motivation, de Talya Lavie
Menção Especial do Júri: L'Enlèvement de Michel Houellebecq, de Guillaume Nicloux
Actor: Paul Schneider, Goodbye to All That
Actriz: Valeria Bruni Tedeschi, Il Capitale Umano
Fotografia: Damian García, Güeros
Argumento: Guillaume Nicloux, L'Enlèvement de Michel Houellebecq
Montagem: Keith Miller, Five Star
.
World Documentary Competition
Documentário Longa-Metragem: Point and Shoot, de Marshall Curry
Menção Especial do Júri: Regarding Susan Sontag, de Nancy D. Kates
Montagem: Sabne Lubbe Bakker e Niels van Koevorden, Ne Me Quitte Pas
.
Best New Narrative Director Competition
Best New Narrative Director: Josef Wladyka, Manos Sucias
Menção Especial do Júri: Alonso Ruizpalacios, Güeros
.
Best New Documentary Director Competition
Best New Documentary Director: Alan Hicks, Keep On Keepin’ On
.
Short Film Competition
Best Narrative Short: The Phone Call, de Mat Kirkby
Best Documentary Short: One Year Lease, de Brian Bolster
Menção Especial do Júri: The Next Part, de Erin Sanger
Student Visionary Award: Nesma’s Bird
Menção Especial do Júri: Cycloid, de Tomoki Kurogi
.
Bombay Sapphire Award for Transmedia
Bombay Sapphire Award for Transmedia: Clouds, de Michael Apostolidis
.
The Nora Ephron Prize
The Nora Ephron Prize: Zero Motivation, de Talya Lavie
Menção Especial do Júri: Ya ne Vernus, de Ilmar Raag
.
Tribeca Online Festival
Tribeca Online Festival Best Feature Film: Vara: A Blessing, de Khyentse Norbu
Tribeca Online Festival Best Short Film: Love in the Time of March Madness, de Melissa Johnson e Robertino Zambrano
.